sábado, 12 de dezembro de 2009

O NAUFRÁGIO DO LUGRE-MOTOR PORTUGUÊS «S. JUDAS TADEU» Á VISTA DE SANTO ANTÓNIO DO ZAIRE

Lugre S. JUDAS TADEU /Imprensa diária- Cortesia Luis Filipe Morazzo/.

A 13.11.1966, uma Terça-feira, dia aziago para os supersticiosos, mas também para todos os tripulantes do lugre-motor Português S. JUDAS TADEU, supersticiosos ou não. O que se sabe é apenas isto: que a embarcação navegava normalmente, aprestando-se a tripulação para descansar um pouco, após o almoço, quando foi recebido na casa do leme o alarme, vindo da casa da máquina. O navio estava a fazer água, cada vez em maior volume. Eram, precisamente, 13h30 e o lugre navegava a cerca de 3 milhas da Ponta da Moita Seca, à vista de Santo António do Zaire. Todos correram aos seus postos. Procedeu-se a uma minuciosa busca nos porões, para se descobrir o rombo, para se localizar a rotura e tentar obturá-la. Mas tudo em vão. A água inundava, já, a casa das máquinas, dificultando todos os serviços. Procurou-se, então, impedir que a inundação progredisse perigosamente, pondo-se a funcionar quatro bombas para o escoamento. Pretendia-se, assim, equilibrar a entrada de água com o seu escoamento, possibilitando o salvamento pelo menos da tripulação.

Durante duas longas horas a tripulação se lançou à desesperada tarefa, contudo sem sucesso. Por isso que, cerca da 16h00, já o barco podia-se considerar, irremediavelmente perdido. Pouco depois, repercutia-se por todo o navio a ordem para o abandonar. E os tripulantes – cinco Europeus e cinco Africanos – correram para as baleeiras, afastando-se, penosamente do lugre prestes a submergir-se.

O S. JUDAS TADEU arrastado pela corrente, alcançara, entretanto o mar alto, escoltado pelas baleeiras dos náufragos esperançados, ainda, num milagre que lhes permitisse senão recuperar o navio, pelo menos voltar a bordo e salvar os seus modestos haveres. Pelas 21h00 o mar abria-se para dar sepultura ao navio e a essas esperanças da tripulação. Esta perdera tudo no naufrágio. E ainda se arriscara para salvar os documentos de bordo, um cão e um gatito ladino que mesmo em momento de tamanha aflição havia de brincar às escondidas. Depois foi a luta pela vida, por horas mortas da noite, nas frágeis baleeiras. Dezoito horas seguidas tiveram os náufragos, esgotados pelo esforço feito para tentarem salvar o seu velho lugre, de remar até alcançarem o porto de Cabinda, em cuja Delegação Marítima o capitão do lugre apresentou o seu protesto de mar. Foram horas de grande ansiedade as que viveu a tripulação, como, também, a boa gente de Santo António do Zaire que chegou a recear pela sorte dos náufragos, sabido que a costa é ali particularmente perigosa devido às fortes correntes marítimas.

O S. JUDAS TADEU pertencia à Sociedade Naval e Comercial de Lisboa e havia sido construído num dos estaleiros da Figueira da Foz em 1923. Durante largo tempo esteve adstrito à frota bacalhoeira com o nome JOÃO JOSÉ SEGUNDO. Saíra em 11 de Agosto de Lisboa para Matadi, com escala por Dacar e S. Tomé e regressava agora de Benguela e Lobito com um carregamento de sal e peixe seco, que deveria ser descarregado em Cabinda, por se destinar ao Congo Belga. De Cabinda seguiria para Lisboa transportando uma carga de madeiras daquele enclave.

Os seus tripulantes eram: Artur Belo de Morais, de 70 anos de idade, natural da freguesia das Mercês, Lisboa, que comandava o navio; José Fernando de Sousa, de 36 anos de idade, de Setúbal. 1º motorista; António da Cruz Pinto, de 43 anos de idade, de Ílhavo, 2º motorista; Francisco Alves de Castro, de 36 anos de idade, de Viana do Castelo, contra-mestre; António Ferreira Correia, de 56 anos de idade, de Ílhavo; marinheiro; António de Jesus Padre, de 17 anos de idade, de Ílhavo, moço de câmara. Além destes, havia mais cinco indivíduos Africanos colocados nos serviços auxiliares. O S. JUDAS TADEU fazia nos últimos tempos, apenas serviço de cabotagem ao longo da costa Angolana, principalmente entre o Lobito e Matadi, no Congo Belga, e anteriormente trafegava entre portos Portugueses, particularmente ao longo da costa continental.

S. JUDAS TADEU – 46,6m/262,5tb/9nós; 04.03.1923 lançado à água por António Maria Bolais Mónica, Figueira da Foz, como HÉRCULES, lugre bacalhoeiro à vela, por encomenda da Companhia Fomentadora Marítima Figueirense, Figueira da Foz; 1926 JOÃO JOSÉ, Costa & Cia., Figueira da Foz; 1933 JOÃO JOSÉ SEGUNDO, Sociedade de Pesca Luso Brasileira, Lda., Figueira da Foz, tendo-lhe sido instalado motor auxiliar e a partir de então, alterna as campanhas da pesca do bacalhau com o tráfego comercial até 1942, ano em que passa definitivamente para o comércio; 19__ S. JUDAS TADEU, Sociedade Naval e Comercial de Lisboa, Lisboa.

Fontes: Jornal O Comércio do Porto - J. Barrote Júnior; Lloyds Register of Shipping; Blogue Navios e Navegadores.

Rui Amaro

6 comentários:

Luis Filipe Morazzo disse...

Caro Rui Amaro

Possuo na minha base de dados uma fotografia deste navio, caso esteja interessado, terei muito prazer em disponibilizá-la

Saudações marinheiras

Luis Filipe Morazzo

Rui Amaro disse...

Caro Luis Morazzo
Já que me pode facultar uma cópia da foto do lugre S. JUDAS TADEU, por favor passe-a através do endereço ruipfa@gmail.com, pois evita-me de compor um desenho aproximado do JOÃO JOSÉ SEGUNDO, que cheguei a ver muitas vezes aqui no rio Douro, mas que sem ser computorizado não fica nenhuma maravilha.
Já agora não terá na sua base de dados o ano do naufrágio, é que no recorte da notícia de “O Comércio do Porto” não registei a data, na altura não havia Internet e muito menos Blogues.
Imensamente grato pela sua disponibilidade e sempre ao dispor.
Saudações marítimo-entusiásticas
Rui Amaro

Luis Filipe Morazzo disse...

Caro Rui Amaro

Acabei de lhe enviar um mail com a fotografia do "S.Judas Tadeu".

Começo por pedir desculpa pela má qualidade da fotografia, mas é a única que possuo deste navio. A razão da má definição da imagem, está relacionada com a sua digitalização, pois foi obtida a partir de um recorte de jornal, datado de 16-11-66, dia do naufrágio ao largo de Cabinda.



É um privilégio para mim, poder ajudar a complementar um blogue, onde tenho aprendido muito nestes últimos tempos. Caso entenda, estarei sempre ao dispor para ajudar.



Aproveitava para desejar ao amigo Rui Amaro, família, e a todos os companheiros de viagem deste magnífico blogue, Festas Felizes e que o Ano 2010 traga bons ventos para todo o grupo.



Saudações marinheiras



Luis Filipe Morazzo

Rui Amaro disse...

Caro Luis Morazzo
Há fotos de certos navios que é mesmo dificil encontrar, e a do S.JUDAS TADEU/JOÃO JOSÉ SEGUNDO é uma delas, mas é o que se conseguiu, e que lhe fico muito grato.
Aproveito para retribuir votos de Feliz Natal e um Bom Ano de 2010.
Saudações maritimo-entusiásticas.
Rui Amaro

JOSÉ MODESTO disse...

Caro Rui Amaro e respectiva família, desejos de um Excelente 2010 com Mtª.Saúde.

Saudações Marítimas
José Modesto

Rui Amaro disse...

Amigo e colega José Modesto
Grato pela tua mensagem de fim de ano cujos desejos para 2010 estou a retribuir.
Faço votos também, que apesar da crise, a navegação para portos Portugueses, nomeadamente para Leixões progrida, para estabilidade das empresas e consequentemente dos trabalhadores do "shipping".
Como já deves ter notado tenho andado ausente dos meus dois blogues e da página "Ships Nostalgia", e a razão é devida a uma segunda intervenção cirúrgica (dois dias 15/16 de Dez.), desta vez embarcado no navio hospital "IPO do Porto" , que constou de implante de prótese para regularização de incontinência urinária,que padeço desde há cerca de três anos, e que felizmente resultou, só que actualmente estou em convalescença, não podendo fazer grandes esforços.
Espero recomeçar em breve, com novos textos para enlevo dos "Shiplovers".
Abraço
Saudações maritimo-entusiásticas
Rui Amaro