Nesta imagem, toda a espectularidade trágica da lenta agonia do MAURA / Jornal O Comércio do Porto /.
Bombeiros em terra, aguardam ordem para puxar o cabo vaivém . Uma pequena multidão, à distância não arreda pé, interessada no espectáculo um tanto invulgar / Jornal O Comércio do Porto /.
Surpreendidos no areal de Francelos, très tripulantes olham taciturnos os seu navio encalhado / Jornal O Comércio do Porto /.
O lançamento de um foguetão para estabelecimento do cabo de vaivém / Jornal O Comércio do Porto /.
Ao centro, de costas, o comandante do MAURA relata aos jornalistas as circunstâncias do sinistro / Jornal O Comércio do Porto /.
O MAURA batido pela forte ondulação / Jornal O Comércio do Porto /.
O MAURA já alquebrado. Os circulos mostram as fendas / Jornal O Comércio do Porto /.
6/08/1973 - Um domingo, manhã
de nevoeiro, sobretudo na costa norte, encontrava-me, eu, na Avenida do Brasil,
situada na marginal marítima da cidade do Porto, quando a névoa clareou um
pouco, junto à costa, e reparo que os rebocadores MONTE DE LEÇA e o gémeo MONTE
DE SÃO BRÁS, e ainda o salva-vidas
CARVALHO ARAÚJO vindos de Leixões navegam junto à costa a toda a força das suas
máquinas. De princípio estranhei, e julguei que iriam entrar no rio Douro, mas
continuaram a rumar a sul, e pensei logo que iam em socorro de algum navio que
estivesse encalhado na costa, e na verdade assim ocorreu. Quando o nevoeiro
desvaneceu, vislumbrava-se perto da capelinha do Senhor da Pedra, um navio de
cerca de 80 metros encalhado nas aguçadas pedras por ali localizadas. Os
rebocadores e o salva-vidas CARVALHO ARAUJO ficaram a pairar ao largo, a fim de
tentarem prestar assistência, mas o navio estava muito à terra.
Era o navio-motor italiano
MAURA, saído no sábado do Tejo e que seguia com destino a Leixões, encalhara a
meio da manhã de ontem em Francelos, sensivelmente em frente às instalações da
Rádio Clube Português, com 2.500 toneladas de carga diversa a bordo, onde predomina
o mármore.
As causas do acidente,
ainda não estão completamente apuradas, embora àquela hora um espesso nevoeiro
envolvesse toda a orla marítima a norte do cabo Mondego. Estranha-se, no
entanto, que as aparelhagens de bordo (radares e sondas) destinadas a avisar da
proximidade de bancos de penedias, ou das costas, não tivessem funcionado… É de
referir ainda que o navio seguia a uma velocidade em excesso para as condições
de tempo, dado que entrou bastante na costa, ficando encalhado a 150 metros do areal…
O alarme foi dado, apenas
às 11 horas.
O elevado número de
banhistas que desde o nascer (imperfectível) do sol escolheram aquele local
para passar um domingo de praia, não se aperceberam, devido, como referimos, ao
denso nevoeiro, que a alguns metros um navio estava em perigo.
Inexplicavelmente, o rádio de bordo não transmitiu nenhum S.O.S., pelo menos
que fosse captado pelas estações radionavais mais próximas. Parece ter sido o
posto da Guarda Fiscal de Miramar que em primeiro lugar se inteirou do acidente,
e que alertou as corporações de bombeiros. Prontamente, compareceram no local
os Voluntários da Aguda, Valadares, Coimbrões, Portuenses e do Porto, equipados
com material de socorros a náufragos. Também a Administração dos Portos do
Douro e Leixões providenciou imediatamente no sentido de socorrer o MAURA,
enviando para o local dois rebocadores, o MONTE DO LEÇA e o MONTE DE SÃO BRÁS.
Igualmente o Instituto de Socorros a Náufragos fez deslocar a Miramar o seu
salva-vidas CARVALHO ARAÚJO, que viria a ter um papel preponderante no
desenrolar dos acontecimentos.
Por meio de foguetões, foi
estabelecido um cabo de vaivém, a ligação entre o navio sinistrado e a terra,
onde os bombeiros de diversas corporações (quase todas vindas de Vila do Conde
onde se encontravam de prevenção às corridas), se entregavam ao trabalho de por
os seus botes salva-vidas, e a estabelecer um sistema de segurança, em caso de
naufrágio.
Com a chegada do CARVALHO
ARAÚJO, 10 dos tripulantes do navio foram evacuados para Leixões, ficando
apenas a bordo o comandante, o capitão Scotto Bartolomeu, o imediato Mirali
Corrado, e o chefe de máquinas Tomé Eliseu, todos italianos.
DOIS FERIDOS EVACUADOS
PARA LEIXÕES
Possivelmente devido à
violência do embate nas pedras, 2 dos 10 evacuados pelo CARVALHO ARAÚJO
necessitaram de receber tratamento no hospital de Matosinhos: o maquinista
Santa Maria Antonio, com escoriações na perna esquerda e o marinheiro Crimani
Nunzio, com contusões lombares, não tendo porém ficado internados.
Já com a linha de
flutuação à vista, três bombeiros voluntários da Aguda entraram a bordo, e ai
permaneceram até ao fim da tarde, assegurando um possível auxilio aos três
tripulantes, em caso do navio tombar. O mar calmo e grande quantidade de pedras
existentes no local, eliminaram a hipótese das ondas partirem o navio. È no
entanto de esperar que, em praia-mar, e com uma ligeira alteração do estado do
tempo, tal venha a acontecer nos próximos dias…
Ao fim da tarde, como
dissemos, os três bombeiros abandonaram o MAURA. A grande quantidade de água
que continuamente entrava no navio, pelos rombos abertos no casco, condenou-o a
uma “agonia lenta”. Mesmo que os rebocadores o possam retirar das pedras há
sempre o perigo (quase certo) de, ao encontrar-se a flutuar, se afunde devido à
água nos porões. Os bombeiros saíram do MAURA pelo cabo de vaivém.
No alto-mar a lei é só
uma, um barco abandonado pertence a quem o apanhar. Na costa, porém, a lei
modifica-se, e com autorização da capitania, os ocupantes de um barco podem
abandoná-lo, sem lhe perderem o direito. Não se compreende pois, por que
insistiram os três tripulantes a bordo em permanecer no navio, mesmo após a
saída dos bombeiros. Dizia-se que estavam à espera de ordens…
O QUE ACONTECERÁ AO MAURA?
O armador do MAURA
encontra-se acidentalmente em Lisboa, e já foi posto ao corrente do que
aconteceu ao seu navio. No entanto, não é a ele que compete decidir sobre o
futuro do MAURA… Logicamente, o navio “está” numa companhia de seguros. E só a
companhia, neste caso, pode salvar ou coordenar, o navio italiano. Sabe-se que
um representante da companhia seguradora já se encontra no Porto, a fim de
resolver o problema. As soluções são diversas:
Salvar o navio: neste caso
há duas hipóteses. Ou tentar rebocá-lo, com o perigo de ele, uma vez liberto,
não aguentar o peso da água nos porões e ir ao fundo, ou levantá-lo por meio de
almofadas de ar, fazendo-o flutuar artificialmente até porto seguro.
Em qualquer dos casos, a
quantia despendida com as operações de salvamento serão sempre na ordem dos
milhares de contos e só a seguradora pode decidir se lhe convirá mais
indemnizar o armador, ou libertar o MAURA e pagar a reparação.
Salvar a carga: em última
hipótese, a companhia pode decidir salvar a carga, e vender a carcaça e as
máquinas de bordo, oferecendo então ao armador uma indemnização. Sabe-se, no
entanto, que devido a água que tem entrado nos porões, parte da carga está
completa, ou parcialmente destruída…
Qualquer das soluções a
adoptar, custará sempre, à companhia de seguros, um prejuízo de milhares de
contos!
A POLUIÇÃO
O sr. comandante Salema,
adjunto da Capitania do Douro, esteve pessoalmente no local, colaborando nas
operações:
- “A partir do momento em
que não há vidas humanas em perigo, o trabalho da APDL, está concluído. Só os
competiria rebocar o MAURA se a sua presença em Miramar fizesse perigar alguma
coisa, ou as prejudicasse a navegação. Como tal não acontece, o assunto
transita para a competência da companhia de seguradora do navio”.
Embora o MAURA seja um
navio relativamente pequeno, o gasóleo que transporta será suficiente, em caso
de derrame, para inundar as praias da zona, poluindo toda a costa de
Francelos-Miramar. Se é banhista nestas praias, prepare-se para sempre que
chegar a casa, limpar o gasóleo do corpo, e esfregar bem com um bom
desodorizante…
Até ao momento, de se
fechar esta tiragem, nada mais se sabia sobre o futuro MAURA, o que faz crer
que durante todo o dia de hoje, se ultrapasse o número de “mirones” que
propositadamente se deslocaram ontem a Miramar.
E na verdade o espectáculo
é tragicamente espectacular…
INFORMAÇÃO DA ÚLTIMA HORA
O mesmo porta-voz confirmar-nos-ia,
ao fim da tarde, a primeira informação: - Oficialmente, não será feita mais
nenhuma tentativa pelas autoridades. O assunto vai ser estudado entre o armador
e a seguradora, com o acordo do agencia consignatária. Ao fim da tarde deve
chegar o sr. Emilio Palombo, representante do armador, sr. Melloni, da cidade
italiana de Sabona, o qual no próprio local, e talvez ainda hoje, em contacto
com Itália, decidirá das diligências definitivas a fazer.
De facto, o dia de ontem,
se foi decisivo quanto ao futuro do navio, adiou uma solução imediata, deixando
antever, no entanto, uma serie de pormenores importantes ao sucedido, na
medida, em que vieram a lume as mais diversas diligencias dos meios ligados às
empresas de navegação envolvidas e das entidades marítimas.
Durante a noite, estava vigilante
o piquete de 13 homens dos Bombeiros Voluntários Portuenses, da Aguda e de
Espinho, sob o comando do Portuense nº 151, Raul Lopes dos Santos, e que
utilizou, até cerca das 2 horas da madrugada os dois projectores de longo
alcance (Aguda e Portuenses), uma vez que a neblina, que a partir da uma hora
da madrugada começou a cair, acabaria por se transformar em nevoeiro cerrado.
No entanto, o nevoeiro e o frio intenso não evitaram que muitos espectadores,
munidos até de cobertores, permanecessem em pleno areal, até ás 4 horas da
madrugada… Durante toda a manhã de ontem, o intenso nevoeiro não permitiu
qualquer alteração da situação, a não ser o engrossar da romaria de curiosos,
veraneantes ou não.
À tarde, dissipada a
grossa cortina de nevoeiro, recortou-se no oceano, azul e calmo, a silhueta do
MAURA, virado de proa a sudeste, absolutamente imóvel, com uma linha de água
perfeitamente normal, o que demonstrava estar firmemente escorado nas formações
rochosas. Muita gente acreditava, porém, que, com a praia-mar, às 15,17 horas,
alguma tentativa poderia ser feita. O que como dissemos no início desta
reportagem, estava desde logo fora dos intuitos das entidades envolvidas.
MENSAGEM DE BORDO:
ANTIBIOTICOS PARA O COMANDANTE
Aliás as condições
meteorológicas deitariam por terra, qualquer tentativa programada para a tarde
de ontem. Assim, se a tabela de marés assinalava a preia-mar às 15,17 horas, o
Observatório da Serra do Pilar registava às 15,15 horas, a rajada máxima,
54km/h, duma ventania agreste, soprando do rumo dominante de Oés-noroeste, e
favorecendo um mar cavado que, junto à costa, se espreguiçava em vagalhões de
respeito.
Precisamente às 15,15
horas, da proa do MAURA, alguém dá sinais, abrindo compassadamente os braços.
Sabíamos, entretanto, que, durante a manhã, a partir das 10,30 horas, várias
chamadas tinham sido tentadas, via rádio através da Estação Central de Radar da
APDL, mas sem êxito, pois não se obtinha qualquer resposta. Tudo indicava, pois
– como mais tarde se viria a confirmar – que o navio estava sem qualquer meio
de comunicações, uma vez que os motores auxiliares e o grupo electrogénio
tinham siso atingidos pela água que entrara pelos rombos nos porões. Isso mesmo
deve ter sucedido pouco antes da meia-noite de domingo, altura em que, segundo
o testemunho do comandante dos Bombeiros Voluntários da Aguda, todas as luzes
do MAURA se apagaram, não restando sequer o sinal obrigatório (luz encarnada).
Entretanto, junto da
pequena tenda que serve de quartel-general das operações dos bombeiros,
precisamente da duna cimeira, fronteiriça ao encalhe, onde está montado o cabo
de vaivém com a bóia-calção, três elementos das tripulação estavam preparados
para tomar o lugar do comandante, primeiro-oficial e operador de máquinas,
ainda presentes no MAURA. Perante a hipótese de uma “molha” monumental (maré
cheia e vento forte, com o cabo virador a rasar as ondas) os tripulantes
recusaram-se à manobra, dizendo que só o faziam se dentro de um bote
pneumático.
Entretanto – e na
expectativa de que, aproveitando a maré cheia, alguém fosse a bordo – apareceu
no local o cabo de mar Amândio, da zona da Aguda, e Miramar, com um recado
escrito: em mensagem da noite anterior, o comandante do MAURA, Bartolomeu
Scotto di Marco, pedia ao tripulante Vicenzo que lhe mandasse o medicamento
“Hipopen” (antibiótico), que estava num saco de plástico da bagagem que levara
consigo para a pensão. Só ao fim do dia, depois das 20,00 horas, o pedido do
comandante viria a ser satisfeito, à falta de outro meio.
Durante as horas passadas
no areal – onde guarda-fiscal, pessoal da Capitania e bombeiros se desdobravam
em esforços – tivemos a oportunidade para falar de várias coisas relacionadas
com o encalhe. Soubemos assim, que a tripulação estava bem (três ficaram numa
pensão de Matosinhos, e os outros sete numa pensão da rua de Entreparedes), à
excepção do cozinheiro Santamia, ligeiramente ferido numa perna, e que se
mostrava, a princípio, um tanto nervoso. Quanto à mascote de bordo, o “Quinto”,
andava muito triste, com a ausência do comandante, e um representante da
Sociedade Comercial Orey & Barros Leite, que durante todo o dia permaneceu
no local, chegou mesmo a aventar a hipótese de o levar à Clinica Veterinária de
Boavista.
Falou-se, também, do
encalhe, ocorrido em Abril de 1947, do navio-motor português ALEXANDRE SILVA,
que decorridos vários meses, haveria de safar-se, e ainda do VALE FORMOSO 1º,
um iate-motor costeiro de madeira, que ali mesmo se desfez devido a um temporal
a 11/1941,
Lamentava-se, ainda, o
azar do filho do comandante Antonio Scotto di Marco, de 19 anos, que anda a
estudar para a Marinha e que, aproveitando as férias, resolveu fazer esta
viagem na companhia do pai… Ao fim da tarde, veríamos o rapaz, triste e de
poucas falas, segurando o rafeiro “Quinto”, pelas dunas da praia.
Atendendo às condições do
mar, causadas pelo vento forte, foi decidido adiar para o fim do dia a ida a
bordo de qualquer outro tripulante, uma vez que a baixa-mar facilitaria essa
tarefa e estaria presente já o sr. Emilio Palombo, inspector do armador.
SISTEMA LLOYD EM ACÇÃO:
“NO CURE, NO PAY”
Já durante a tarde,
estivera em Francelos, recolhendo elementos, o sr. Burmester, da companhia de
navegação com o mesmo nome, ligada ao sistema internacional de seguros
marítimos Lloyd’s, que nos pôs ao corrente duma importante “démarche” que
poderá vir a dizer o futuro do MAURA.
Como se sabe o famoso
“Lloyd’s open form” aplica-se a quem quer que seja e onde quer que seja e onde
quer que esteja (no mar), no regime de “no cure, no pay”, isto é (à letra: não
havendo cura, não há paga), se a tentativa (do salvadego) falhar, a nenhuma
indeminização terá direito, se resultar, vigorará o acordo entretanto
celebrado.
Assim, vinha (na tarde de
ontem) já a caminho, da Corunha, o salvadego alemão SEEFALKE, 1924/ 60,8m/
570tb/ 2xmotores/ 3.000hp/ 15nós/ da Bugsier Reederei, Bremerhaven, que se
presumia como chegando directamente ao local do encalhe no fim da madrugada
passada, mais para o romper do dia. Aquele salvadego está apetrechado de
pessoal técnico (engenheiros) que, imediatamente, farão uma vistoria às
possibilidades de salvamento do navio. Ao mínimo vestígio, se houver “chance”,
é tentado um acordo, mediante uma proposta que é feita ao armador e à
seguradora.
Pelo que se expõe, à
primeira vista, as possibilidades são más, para uma operação do salvadego.
Note-se que, na praia-mar de ontem, a linha de flutuação estava a oito pés,
quando no inicio do encalhe era de dez pés à proa e e doze pés à popa. E, para
mais a embarcação estava absolutamente imóvel, não dando o mínimo sinal de
balancear à forte agitação do mar. Isso significa que – tal como viria a
confirmar-se – na baixa-mar ficará a zero. Esse facto, aliado aos rombos nos
porões e casa das máquinas, e ainda à existência de 1.200 toneladas de carga,
torna a operação muito difícil.
No caso do pessoal técnico
do SEEFALKE verificar qualquer hipótese de salvamento, as operações de
definitivas, uma vez acordada a respectiva proposta orçamental, ficarão a cargo
de outro(s) salvadego(s), completamente apetrechado(s) que logo serão
solicitados. Lembremos que essa foi a solução adoptada para os casos dos navios-motor
ingleses LANRICK (estrada do cais do Cavaco) e do LAVEROCK, encalhado junto à
Afurada, não há muito encalhados (pelas cheias do rio Douro).
Uma outra hipótese chegou
a “flutuar” nos meios afectos à navegação presente na praia de Francelos, e
cuja confirmação não nos foi possível apurar. Tratar-se-ia de um outro
salvadego, já a caminho de Lisboa, fretado precisamente pelo armador do MAURA,
para reposição de um outro navio desse mesmo armador. Esse salvadego que,
dizia-se, a todo instante poderia surgir ao largo de Miramar, não foi visto, porém,
até já depois das 21 horas, altura em que abandonamos o areal de Francelos,
varrido por inclemente ventania.
HELICOPETROS GIGANTES PARA
RETIRAR A CARGA
Metade da carga (cerca de
600 toneladas em mármores) que o MAURA carregara em Lisboa, destinava-se a
portos do Mediterrâneo: Marselha. Livorno e Génova. Destinada a Leixões, vinha
uma carga diversa) cerca de 600 toneladas, das duas mil, total da capacidade do
navio, constituída, principalmente por cutelarias, borracha, sintéticos,
acessórios e tubagens para a segunda fase da Refinaria da Sacor, etc.
Sobre este assunto, em
contacto com os srs. Valente e Moreira, da Euronave, agentes do armador,
soubemos da gravidade da situação no que respeita ao material (estruturas
metálicas) destinadas à segunda fase em
tremenda expansão) da Refinaria do Porto, material esse computado em quatro mil
contos, embarcado em Livorno, e cuja fabricação demorará cerca de um ano.
Nesta ordem de ideias, os
esforços máximos estariam a ser envidados para reaver intacto e a tempo o
material metálico em causa, para o que, julgava saber-se de boa fonte, estarem
já adiantadas as diligencias que davam como certa, em Francelos, a presença de
helicópteros gigantes, de gancho, para a respectiva descarga no mar. Mais se
adiantava que os eventuais helicópteros, alemães, se deslocariam da base
espanhola de Cádis,
LUZ VERDE DOS BOMBEIROS À
“OPERAÇÃO POLUIÇÃO”
Pelas 19,30 horas, chegou
a Francelos o sr. Emilio Palombo, inspector do armador do navio. Na tenda dos
bombeiros, e na presença, dos representantes da Euronave, agentes do armador. da,
Sociedade Comercial Orey & Barros Leite, agentes da carga (fretada à Union
Industrielle Maritime, Paris) e da autoridade marítima, inteirou-se rapidamente
da situação, ele que, acidentalmente em Lisboa, fora prontamente alertado por
um representante da Sociedade Comercial Orey & Barros Leite, que por sua
vez nesse sentido recebera uma mensagem do comandante do MAURA, já encalhado.
Procurou-se, depois.
Estabelecer contacto com o pessoal de bordo, utilizando-se para tanto os sinais
luminosos do aerógrafo mecânico dos Bombeiros Voluntários da Aguda. Perante o
silencio de bordo, o B. V. Portuenses atiraram, então, à pistola, vários “very
lights”, de várias cores e longo rastilho de fumo- Entretanto, utilizando os
“walk-talkies” dos Portuenses, o sr.
Palombo chamava.
- Parla, MAURA. Parla MAURA,
cambia. Allô comandante!...
O silencio prolongou-se,
até que, além surgiu, gesticulando com os braços em cruz, na proa do navio. Ia
iniciar-se o transbordo pelo cabo de vaivém, do contramestre, Mario Scotto di
Carlo, que já ali estivera de tarde. Em sapatos e com um grosso casaco
impermeável, foi metido na boia-calção, levando consigo os medicamentos
pretendidos pelo comandante e um “walk-talk” (rádio transmissor portátil) dos
Portuenses. Demorou dez minutos, o lento puxar da corda, pela roldana suspensa
no cabo mais grosso, e o facto mereceu dos inúmeros circunstantes alguns
sorrisos, especialmente quando a meio do percurso, o contramestre teve de
molhar os sapatos nas ondas.
De seguida, e via rádio,
estabeleceu-se longo contacto entre o comandante do MAURA e o inspector
Palombo. Pão e água – eis quanto pediam de bordo, uma vez que a despensa
comestível de bordo já tinha sido todo devorada pelos três tripulantes
solidários. Mais soubemos que o comandante do MAURA estava um tanto abatido,
mas que a simples existência do meio-rádio a bordo, para comunicar com terra,
lhe modificara muito o ânimo.
Um outro aspecto
fundamental da conversação – rádio foi, a solicitação do representante da
Capitania, o problema do combustível, a fim de ser evitada a poluição das
praias vizinhas, Soube-se, assim, que nos tanques, o MAURA devia ter, segundo
informação do chefe de máquinas, umas trinta toneladas de combustível (a
capacidade total é de cerca de oitenta. Ficou decidido que, a partir da manhã
de hoje, se procederia à bombagem do gasóleo, utilizando as motobombas dos
bombeiros e uma tubagem que deverá atingir as duas centenas de metros).
O “código entre o MAURA e
o piquete de terra ficou assente, durante a noite, através de sinais luminosos;
o aerógrafo e uma lanterna (de bordo) para se iniciare, a seguir, as
conversações via-rádio.
No local esteve,
igualmente, o chanceler do consulado de Itália, sr. Vittorio Dolce, que
procedia a diligências com vista ao envio de um (extenso) telegrama ao
Ministério dos Negócios Estrangeiros sobre o assunto. Embora o diário de bordo
esteja já em terra, o comandante do navio terá de fazer, no consulado, um
relatório do sucedido.
AVARIA NA SONDA –
EXPLICAÇÃO DO COMANDANTE DI NAVIO PARA O ENCALHE
O voluntário dos Bombeiros
da Aguda, Joaquim Santos Silva, também tripulante do salva-vidas da mesma praia
e ainda banheiro na praia da Granja, um dos homens que esteve a bordo do MAURA,
obteve da parte do comandante uma explicação para o sinistro.
“A sonda avariou, foi o
que ele me disse, acrescentando depois, que a corrente arrastou muito o navio
para a costa”.
O inegável que o encalhe
do MAURA depois das 11 horas do passado domingo, se verificou no meio de denso
nevoeiro na zona de Miramar. Os tripulantes foram unanimes e peremptórios em
afirmá-lo, dando esse facto como única causa do desastre. Para mais que o
comandante Scotto di Marco é um marítimo calejado nestas viagens com rota para
Leixões. Mesmo assim, as circunstâncias do encalhe, com o navio aproado a
terra, e sem qualquer pedido prévio de socorro por deficiência a bordo, não
deixaram de levantar fortes suspeitas de negligência, hipótese, aliás,
firmemente repudiada por alguns meios ligados à navegação.
Ontem mesmo, porém, e de
fontes dignas de credito, colhemos a opinião firme e solene de que o encalhe se
ficou devendo a erro humano, o que, foi-nos dito, e altamente provável nas
coisas do mar, especialmente com nevoeiro. Vejamos:
O primeiro comunicado do
MAURA, registado em fita magnética, foi recebida na estação central de radar da
APDL, às 11,52 horas, e nela o comandante dizia simplesmente que estava
encalhado num banco de pedras, a cerca de três milhas e meia de Leixões,
quando, realmente, estava a sete milhas, em relação ao radar da estação. Mas
este desfasamento não é significativo, porque há navios, que tomam como ponto
de referência a ponta do Esporão.
Apuramos, também, que
volvida cerca de meia hora sobre o envio do rebocador, o comandante do MAURA
emitiu nova mensagem, na qual pedia ao representante do agente fretador que entrasse
em contacto com o inspector do armador, que sabia estar em Lisboa. Nessa
altura, e só nessa altura, o comandante referiu que tinha tido uma avaria no
radar.
È claro que isso não
justificava o encalhe. A bússola só por si, não seria o bastante para evitar o
acidente, pois, mesmo com o descaimento do navio, ela continuaria a manter-lhe
a linha Norte direita. Seria necessário, para a consumação do encalhe que
igualmente a sonda avariasse. Com o radar avariado, e na certeza, por causa do
nevoeiro, bastava sondar. O próprio marulhar, aliás, seria motivo de alarme. È
natural que essa avaria no radar, não passasse pela cabeça do comandante que
podia estar muito próximo de terra. De qualquer modo, podia sondar, para
verificar quantos metros há de um lado e do outro, e desviar o navio para fora.
A verdade é que, naquele local, o mar começava a partir com intensidade, e esse
pormenor seria evidente.
Sem pretender de algum
modo, especular com hipóteses, antes com factos, colhemos na tarde de ontem, de
fontes insuspeitas e dignas de crédito, a informação de que “fora de qualquer
dúvida, o encalhe se deve a erro humano”. Perante o nosso espanto, a reacção
foi pronta: - Em caso de nevoeiro, só havia uma solução, que era rumar ao
largo.
Em caso de dificuldade, as
embarcações recorrem a outras, fazendo ponte. E o MAURA estava numa zona em
que, em princípio, deveria já ter comunicado com a Estação Radar de Leixões.
Mas é um facto também, há navios que demandam Leixões, e que possuindo
instalação de VHF não comunicam. Neste caso foi a regra ou a excepção?
SALVADEGO DESVIADO
O SEEFALKE que saíra da
Corunha, onde fazia estação, de rumo ao MAURA, recebera um rádio S.O.S. de um
navio em dificuldades no Atlântico, pelo que rumou ao seu encontro, e rebocou-o
não se sabe para que porto. Para substituir o SEEFALKE, ficou de vir da
Alemanha o PACIFIC ou ATLANTIC, mais modernos e de maior potência, que não
chegaram a aparecer, talvez por desistência.
Poucos dias depois do
encalhe, estava, eu, sentado no molhe de Felgueiras, ao fim da tarde, e
vislumbro vindo de sul, muito fechado com a costa, uma embarcação, que chegado
junto do MAURA, aproou a leste, e reconheci ser um potente salvadego da L. Smit
& Co’s International Sleepdienst, de Hook of Holland, o qual fundeou, e de
imediato lançou à àgua a lancha de serviço, levando a bordo os técnicos, que
foram inteirar-se da possibilidade de resgate do MAURA, e passado cerca de meia
hora regressaram a bordo, e o salvadego suspendeu e tomou rumo de sudoeste,
tendo desistido de realizar qualquer contracto. Apesar de eu conhecer toda a
frota daquela importante companhia holandesa de rebocadores, não me foi possível
identificar o nome do rebocador.
SIMPLESMENTE MAURA
Na sua lenta agonia, o
navio italiano ficou a passar por uma fase que avizinha a sua completa
destruição.
Com o bater denodado das
elevadas voltas de mar, que tem varrido a coata, ampliaram-se as três fendas no
férreo casco. E de tal modo que a popa se tornou presa fácil, nas garras do
mar. Para que a separação se concretize, bastará que o temporal se prolongue
por mais uns dias.
Há muito que se perderam
as esperanças de salvação de grande parte da carga. E pelo rumo que as forças
da natureza pretendem impor, esbranquiçando a costa em voltas de mar perdidas e
violentas, muito difícil se tornará trazer para terra, com possibilidade de
utilização, mercadoria que, destinada a empresas da praça do Porto, jamais será
recuperada.
Entretanto o MAURA
alquebrou, o que tornou inviável o seu resgate e da carga ainda s bordo, foi
considerado “perda total constructiva”
Mais tarde foi vendido a
um sucateiro, que tratou de o desmantelar no local para sucata.
MAURA – imo
5389683/ 84,5m/ 1.998tb/ 1xdiesel/ 15,5nós; 06/1958 entregue por W. Holst
Schiffswerft, Neuenfelde, Hamburgo, como WILHELM WESCH a Jonny Wesch, Hamburgo;
1971 MAURA, Torre Canal SpA di Navigazioni, Cagliari, Sardenha.
O MAURA num porto italiano / Photoship co. UK - Unknown author, who I ask permission to the continuation of the excellent photo in the blog, for which I thank very much..
Fontes: Jornal O Comércio
do Porto, Miramar Ship índex.
Rui Amaro
ATTENTION.
If there is anyone who thinks they have “copyrights” of any images/photos
posted on this blog, should contact me immediately, in order I remove them, but
will be sadness. However I appeal for your comprehension and authorizing the
continuation of the same on NAVIOS Á VISTA, which will be very much
appreciated.
ATENÇÃO: Se houver alguém que se
ache com direitos sobre as imagens postadas neste blogue, deve-o comunicar de
imediato. a fim da(s) mesma(s) ser(em) retirada(s), o que será uma pena,
contudo rogo a sua compreensão e autorização para a continuação da(s) mesma(s)
em NAVIOS Á VISTA, o que muito se agradece.
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