Durante duas longas horas a tripulação se lançou à desesperada tarefa, contudo sem sucesso. Por isso que, cerca da 16h00, já o barco podia-se considerar, irremediavelmente perdido. Pouco depois, repercutia-se por todo o navio a ordem para o abandonar. E os tripulantes – cinco Europeus e cinco Africanos – correram para as baleeiras, afastando-se, penosamente do lugre prestes a submergir-se.
O S. JUDAS TADEU arrastado pela corrente, alcançara, entretanto o mar alto, escoltado pelas baleeiras dos náufragos esperançados, ainda, num milagre que lhes permitisse senão recuperar o navio, pelo menos voltar a bordo e salvar os seus modestos haveres. Pelas 21h00 o mar abria-se para dar sepultura ao navio e a essas esperanças da tripulação. Esta perdera tudo no naufrágio. E ainda se arriscara para salvar os documentos de bordo, um cão e um gatito ladino que mesmo em momento de tamanha aflição havia de brincar às escondidas. Depois foi a luta pela vida, por horas mortas da noite, nas frágeis baleeiras. Dezoito horas seguidas tiveram os náufragos, esgotados pelo esforço feito para tentarem salvar o seu velho lugre, de remar até alcançarem o porto de Cabinda, em cuja Delegação Marítima o capitão do lugre apresentou o seu protesto de mar. Foram horas de grande ansiedade as que viveu a tripulação, como, também, a boa gente de Santo António do Zaire que chegou a recear pela sorte dos náufragos, sabido que a costa é ali particularmente perigosa devido às fortes correntes marítimas.
O S. JUDAS TADEU pertencia à Sociedade Naval e Comercial de Lisboa e havia sido construído num dos estaleiros da Figueira da Foz em 1923. Durante largo tempo esteve adstrito à frota bacalhoeira com o nome JOÃO JOSÉ SEGUNDO. Saíra em 11 de Agosto de Lisboa para Matadi, com escala por Dacar e S. Tomé e regressava agora de Benguela e Lobito com um carregamento de sal e peixe seco, que deveria ser descarregado em Cabinda, por se destinar ao Congo Belga. De Cabinda seguiria para Lisboa transportando uma carga de madeiras daquele enclave.
Os seus tripulantes eram: Artur Belo de Morais, de 70 anos de idade, natural da freguesia das Mercês, Lisboa, que comandava o navio; José Fernando de Sousa, de 36 anos de idade, de Setúbal. 1º motorista; António da Cruz Pinto, de 43 anos de idade, de Ílhavo, 2º motorista; Francisco Alves de Castro, de 36 anos de idade, de Viana do Castelo, contra-mestre; António Ferreira Correia, de 56 anos de idade, de Ílhavo; marinheiro; António de Jesus Padre, de 17 anos de idade, de Ílhavo, moço de câmara. Além destes, havia mais cinco indivíduos Africanos colocados nos serviços auxiliares. O S. JUDAS TADEU fazia nos últimos tempos, apenas serviço de cabotagem ao longo da costa Angolana, principalmente entre o Lobito e Matadi, no Congo Belga, e anteriormente trafegava entre portos Portugueses, particularmente ao longo da costa continental.
S. JUDAS TADEU – 46,6m/262,5tb/9nós; 04.03.1923 lançado à água por António Maria Bolais Mónica, Figueira da Foz, como HÉRCULES, lugre bacalhoeiro à vela, por encomenda da Companhia Fomentadora Marítima Figueirense, Figueira da Foz; 1926 JOÃO JOSÉ, Costa & Cia., Figueira da Foz; 1933 JOÃO JOSÉ SEGUNDO, Sociedade de Pesca Luso Brasileira, Lda., Figueira da Foz, tendo-lhe sido instalado motor auxiliar e a partir de então, alterna as campanhas da pesca do bacalhau com o tráfego comercial até 1942, ano em que passa definitivamente para o comércio; 19__ S. JUDAS TADEU, Sociedade Naval e Comercial de Lisboa, Lisboa.
Fontes: Jornal O Comércio do Porto - J. Barrote Júnior; Lloyds Register of Shipping; Blogue Navios e Navegadores.
Rui Amaro