O vapor Inglês DARINO, conduzido pelo piloto José Fernandes Amaro Júnior, enfrenta a forte corrente de cheia entre as bóias da Cantareira/Arribadouros, que se encontravam afogadas ou desaparecidas em 28/12/1927 / foto de autor desconhecido - colecção Rui Amaro /.
A navegabilidade no porto comercial do Douro, ou seja entre a barra e a ponte D. Luis, em tempos idos jamais foi paralisada por falta de bóias de sinalização, mesmo em condições de cheias em que essas balizas portuárias eram levadas barra fora devido à intensa corrente fluvial ou ficavam afogadas pela subida vertiginosa das águas, que como é sabido chegavam a inundar as margens ribeirinhas, causando prejuízos sem conta. A própria bóia da barra, que assinalava o resguardo necessário para se evitar as pedras do Dente e a da Forcada, devido à forte ondulação desaparecia ou deslocava-se mais das vezes para local impróprio e a sua reposição também era bastante demorada. Usualmente as bóias idas barra fora, mais tarde davam às praias vizinhas.
Dizia-me o meu pai, um piloto da barra, que aqueles meios de sinalização faziam bastante jeito, mas não era pela falta deles que o piloto-mor fechava a barra, pois não era motivo de preocupação, porque confiava nos seus subalternos pelo seu profundo conhecimento e experiência da navegabilidade e manhas da barra e do rio, e não foi por falta de bóias que houve qualquer acidente, aliás houveram acidentes sim, pelo desgoverno dos navios sobre essas balizas e as suas amarras pegarem-se nas hélices ou nas portas do leme. Note-se que no antigamente as cinco bóias, então existentes não eram luminosas como hoje em dia, e mesmo assim não eram motivo impeditivo para que a navegação do tráfego local deixasse de se movimentar na barra e no rio, antes do alvor ou já depois da vinda da noite, e aquela de maior porte, cuja navegação estava interdita durante a noite, somente em caso de muita necessidade, também o fazia com segurança suficiente, apesar do rio Douro ser bastante estreito. Está claro, que os pilotos orientavam-se pelas suas referências em terra, fosse de dia ou de noite.
Em caso de extrema necessidade, não para substituir qualquer bóia mas sim para demarcar um imprevisto banco de areia, arranjavam-se alguns pedaços de cortiça sobrepostos, levando no meio uma vara de madeira ostentando no topo um pano vermelho a servir de bandeirola e cordame suficiente amarrado a uma pesada poita, a qual era lançada à água e que durante a maré serviria de baliza ou então, a embarcação do piloto-mor ou da assistência ficava a sinalizar o local, de pendão ao alto, com a bandeira da corporação de pilotos.
No local critico do rio, particularmente em ocasiões de águas de cima ou ventos fortes, que é o lugar das Lobeiras de Gaia, penedia a sul estendida para o estreito canal de navegação, com uma curvatura deveras acentuada, delimitado a norte pelo banco de areia denominado da Porta Nova, Banhos ou Porto-A, diante do edifício da capitania do Douro, local onde um simples descuido ou guinada a ambos os bordos já originou que navios tivessem de lançar ferro, a fim de evitar o seu encalhe, e alguns acabaram mesmo por ficar em seco durante horas, não existia qualquer bóia de sinalização, como hoje lá estão, então os pilotos também se guiavam pelas suas marcas em terra.
Da esquerda para a direita, NRP ESPADARTE, NRP GOLFINHO e NRP DELFIM, amarrados no lugar da Ribeira, Porto, vendo-se o NRP DOURO amarrado ao cais do Terreiro /foto de autor desconhecido - colecção F. Cabral - Porto /.
As bóias faziam um certo jeito, em navegação com nevoeiro, como no episódio que se relata:
02/07/1946, pelas 06h30, no lugar da Ribeira, margem direita do Douro, estavam prontos para largar com destino ao porto de Viana do Castelo, os submarinos da armada nacional, NRP DELFIM, NRP GOLFINHO e o NRP ESPADARTE, todos eles em 14' de calado, que juntamente com o contratorpedeiro NRP DOURO, que largaria no dia seguinte de rumo ao Tejo, estavam de visita à cidade do Porto, a fim de representar a Marinha nas festas da cidade, o São João do Porto, a que se juntara também a lancha de fiscalização das pescas NRP DOURADA, afecta ao Departamento Marítimo do Norte. O nevoeiro era cerradíssimo sem que se vislumbrasse maneira de se dissipar, e os submarinos tinham de sair naquela manhã, muito cedo.
Chegado perto das 09h00, o nevoeiro desvaneceu um pouco, e como os pilotos não poderiam esperar mais, porque a maré estava-lhes a fugir, aproveitaram e conferenciando com os comandantes, decidiram-se por largar pelos seus próprios meios, não necessitando da assistência de rebocadores.
O primeiro a desandar proa à barra foi o NRP DELFIM, piloto José Fernandes Amaro Júnior, meu pai, que entretanto se vê embaraçado com o recrudescimento da névoa, ficando incapaz de distinguir ambas as margens para uma boa orientação, mas agora há que seguir enfrente e silvando, seguido dos outros dois. A lancha das amarrações toma a dianteira, para prevenir qualquer obstáculo, pois somente no lugar do Ouro, é que se posicionavam as primeiras bóias.
José Fernandes Amaro Júnior, piloto da barra, 1955
Seguem rio abaixo, orientando-se pelos barulhos de terra, já de há muito conhecidos. Ruídos da intensa faina fluvial, da Alfandega, dos carros eléctricos, da Central da Carris, da Fundição de Massarelos, das várias oficinas metalúrgicas, dos estaleiros navais, até que a lancha buzina, assinalando que tem a bóia do Ouro pela proa, e pouco depois a da Ínsua, seguindo-se-lhe a da Cantareira, e passa diante do cais do Marégrafo (Pilotos) e do dique da Meia Laranja sem conseguir descortinar terra, contudo vale-se do toque do sino do farolim da barra, situado no molhe de Felgueiras, que lhe vai servindo de orientação para passar safo da bóia da barra, e entretanto, o comandante é informado via rádio, que o NRP ESPADARTE e o NRP GOLFINHO por receio dos respectivos comandantes fundearam. O primeiro junto da Afurada, e o segundo no lugar do Ouro, contra vontade dos seus pilotos, respectivamente Joaquim Alves Matias e Bento da Costa. O NRP DELFIM já fora da barra, desembarca o piloto. Note-se que naquele tempo, aqueles submarinos não estavam providos de radar, também pouco ou nada ajudaria.
O NRP ESPADARTE, após o nevoeiro se dissipar um pouco, e já com a maré a descer passa a barra, sem qualquer percalço. No que respeita ao NRP GOLFINHO, parece que depois de já se encontrar fundeado junto à margem, com o vento e a corrente do rio descaiu e sem que se desse por isso, por falta de visibilidade, ficou encalhado num banco de lodo, muito junto à margem, safando-se e saindo a barra ao final do dia, sem mais novidade.
Aqueles três submarinos da 2ª esquadrilha, 69m/ 854td à superfície/ 1.105td em imersão, foram construídos de acordo com o programa naval de 1930, da responsabilidade do ministro da marinha vice-almirante Magalhães Correia, pelos estaleiros Ingleses Vickers-Armstrongs Ltd, Barrow-in-Furness, e foram entregues à Marinha de Guerra Portuguesa conforme segue: NRP DELFIM, 01/12/1934; NRP ESPADARTE, 09/01/1935 e o NRP GOLFINHO, 20/02/1935.
Esta esquadrilha viria a desenvolver a sua intensa actividade até finais de 1950, na qual se realça a participação em todas a manobras e exercícios da nossa Marinha de Guerra, nas águas do continente, Açores e Madeira, a viagem de estudo e soberania realizada pelo NRP GOLFINHO à Guiné em 1939 e a visita do NRP GOLFINHO e do NRP DELFIM a Sevilha nas vésperas de eclodir a 2ª Guerra Mundial.
Durante este período conturbado da História Mundial garantiram também o treino e a experimentação de novas tácticas anti-submarinas às nossas unidades de superfície. Não será demais afirmar que a esquadrilha de submarinos, embora fazendo parte de uma Nação não beligerante se mantinha pronta para combate.
O NRP DELFIM rumando à doca comercial do porto de Viana do Castelo em 02/07/1946 / Jornal O COMÉRCIO DO PORTO/.
Durante este período conturbado da História Mundial garantiram também o treino e a experimentação de novas tácticas anti-submarinas às nossas unidades de superfície. Não será demais afirmar que a esquadrilha de submarinos, embora fazendo parte de uma Nação não beligerante se mantinha pronta para combate.
No dia 07/12/1950 efectuava-se a cerimónia de desarmamento daqueles três submarinos, que foram vendidos a um sucateiro com estaleiro localizado numa das margens do estuário do Tejo, depois de se ter negociado com o governo Inglês, a cedência de três submarinos com um pouco mais de três anos de serviço, que foram rebaptizados de NRP NARVAL, NRP NAUTILO e NRP NEPTUNO, e passaram a pertencer à 3ª esquadrilha. O NRP GOLFINHO sofreu um violento incêndio quando do seu desmantelamento.
Fontes: José Fernandes Amaro Júnior; Marinha de Guerra Portuguesa
Rui Amaro
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