quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

SERÁ QUE A SUIÇA, PAÍS SEM MAR, TEM MARINHA MERCANTE OCEÂNICA!?


O CARITAS I, um dos primeiros vapores da Marinha Mercante Suíça. A imagem mostra-o ao serviço da Cruz Vermelha Internacional durante a II guerra mundial. /(c) SR. Basel/


O GENEROSO ex Português GONÇALO VELHO da CNCA de Ponta Delgada, em Leixões 1950 /(c) Foto-Mar. Leixões

A Suíça não é seguramente uma nação de navegadores, mas a sua Marinha Mercante contava com um número substancial de marinheiros, que já embarcaram em navios das frotas oceânicas, lacustres ou fluviais do rio Reno, por conseguinte esse pais interior não tem só deliciosos chocolates e queijos, pistas de gelo para esquiadores, montanhas para escaladas e alpinismo, lagos de uma beleza inconfundível. Possui também "uma diminuta marinha de guerra", se assim se poderá qualificar, própria para fiscalização fluvio-lagunar, e operada pelo exército nacional.
Enquanto nos anos 60 do século XX, ainda era possível encontrar cerca de 600 tripulantes, dentre os quais também oficiais de nacionalidade Suíça embarcados nos vários navios daquele país interior, presentemente os jovens Suíços, como os de outros países, dentre os quais Portugal, perderam o seu fascínio e atracção pela actividade marítima como forma de vida, sobretudo cidadãos Portugueses, Italianos, Alemães, Espanhóis também lotavam as equipagens dos navios Suíços.



O navio-motor MALOJA (2) largando do porto de Leixões, anos 60, /(c) Foto Rui Amaro/

O navio-motor GRANDSON, um dos primeiros navios da Keller Line a escalar Leixões, anos 50, /(c) Imagem do armador/

Hoje em dia não passam de uma mera meia dúzia, o resto das tripulações vem de outros países de baixíssimos salários e de fraca ou nenhuma qualificação, a maior parte vindo das Filipinas, Sri Lanka, Bangladesh, Paquistão, Indonésia, países do Leste, etc. A razão é puramente financeira e em favor da feroz competitividade e esses tripulantes de conveniência trabalham pela metade de um salário ou ainda menos, que se pagaria a um profissional da Suíça ou de um pais de tradição marítima como os da Europa Ocidental, um salário aceitável.
Ainda há poucas semanas naufragou ao largo da Corunha o navio flúvio-oceânico BRAGA, de registo MAR, da Naveiro, uma companhia Portuguesa de sucesso, embora a causa fosse o mau tempo, lamentavelmente, já no helicóptero de resgate, faleceu o seu capitão de nacionalidade Portuguesa, formado pela Escola Náutica Infante D. Henrique, uma das mais categorizadas a nível mundial, e da tripulação faziam parte 2 Portugueses, 2 Russos e 2 Cabo-Verdianos, tripulação suficiente para aquele tipo de navio, dado que era todo automatizado.
Eu atendia em Leixões por volta de 1988, um porta-contentores de 105m/3.500tb, de bandeira de Antigua e Barbuda com 12 tripulantes, pertencente a um importante armador Alemão, dos quais o capitão e o 1º maquinista, Alemães, auferiam à volta de 800.000$00 cada, ao passo que a restante tripulação Filipina, desde o imediato ao moço de convés ia de 60.000$00 a 20.000$00, e diziam eles que era um óptimo salário, e depois havia o problema do entendimento, porque um Alemão e um Filipino a falar inglês, dificilmente se entendem, e é verdade, porque uma certa ocasião, eu testemunhei, o capitão, por ordem do piloto, mandar largar o ferro de estibordo para evitar o embate na muralha e o imediato percebeu bombordo, e como “capitão manda e marinheiro obedece”, o de bombordo é que foi para o fundo, e o navio ganhou uma valente amolgadela e por um triz não colidiu com o navio que se encontrava por vante, que também estava ao meu cuidado. E quando há tripulações de várias nacionalidades, então é que é o bom e o bonito, mas assim é que vale a pena por ser "mão de obra baratinha”, e já assisti a casos de haver tripulantes Africanos, que compunham a lotação, apenas pelo alojamento e alimentação. Está claro eram navios degradados de certas bandeiras de conveniência e de armadores apelidados de “piratas”, que mais tarde começaram a ser controlados e retidos nos portos pela autoridade marítima, nomeadamente pelo “state port control”.
Mas há mais! Mau tempo de perigar o navio, mas o capitão como responsável pela navegação, entende que não deve abandonar o porto e os tais “armadores financeiros” que não percebem nada mas mesmo nada de mar, só pensam em lucros chorudos, exigem que o navio largue, caso contrário ameaçam não só com a substituição do capitão, assim como da sua tripulação. Exigências, verdadeiramente inadmissíveis!


O navio-motor MURTEN (1) demandando o porto de Leixões, década de 50, /(c) Foto-Mar. Leixões/

O navio-motor ARBEDO demandando o porto de Leixões, década de 60, /(c) Foto-Mar, Leixões/

A bandeira de conveniência e de segundo registo pegou na moda e não há quem lhe dê a volta. Valha-nos o “nosso” registo da Madeira (MAR), que parece não ser tão gravoso e pelo menos dá possibilidade da bandeira de Portugal ser vista por esses mares fora.
Presentemente a frota oceânica Suíça é constituída por cerca de 35 navios, que navegam por todos os mares sob pavilhão Helvético. A sua frota foi criada durante a II Guerra Mundial com tonelagem de segunda mão para assegurar o abastecimento do pais e foram de enorme valia para Portugal, relativamente à importação de cereais, devido à escassez de transporte existente, e faziam do porto de Lisboa seu porto de armamento. Actualmente os seus navios garantem não apenas o abastecimento em tempos de crise, mas também as exportações Suíças, como no passado através dos portos de Itália, França, Benelux e Alemanha.
Durante aquele conflito foram afundados ou sofreram danos graves os seguintes vapores: MALOJA (1), CHASSEZAL, ALBULA e GENEROSO (1), alguns ao serviço da Cruz Vermelha Internacional e também transportando carga para Lisboa e Leixões.
As empresas Suíças de marinha mercante são obrigadas a disponibilizar os seus navios ao governo em caso de necessidade. Em troca este garante às companhias o crédito na compra de novas unidades. Basileia é o porto de matrícula dos navios de bandeira Helvética.
A Suíça tem sido e continua a ser sede e centro de decisão de importantes companhias de navegação Helvéticas e de outros países, tais como a Keller Shipping, Mediterranean Shipping Company, Oceana Shipping, Reederei Zurich, Suisse Atlantic, Suisse Outremer, ABC Maritime, Acommarit, etc.
Finais da década de 70 do século XX a bandeira Suíça começou a desaparecer dos portos Portugueses, nomeadamente de Lisboa e Leixões, portos que eram frequentados, regularmente pelos navios da Keller Shipping (Keller Line), motivado pela praga de camiões TIR que surgiram no nosso país, vindos da Suíça, Itália, Sul de França, Espanha, que se apoderaram do tráfego, até então utilizado pela tradicional via marítima, a mais económica.
Aí vão os nomes de navios de bandeira Suíça que escalaram os portos de Leixões ou Douro, desde a I guerra mundial, de que me recordo: CARITAS I, CARITAS II, MALOJA (2), SEMPACH, LAUPEN (1-2-), GRANDSON (1-2-3), MURTEN (1-2-3), ARBEDO, GENEROSO (2) ex Português GONÇALO VELHO, RHONE (1-2), RHIN (1-2), GENERAL GUISAN, NYON e SILVAPLANA e poucos mais.
Em Basileia, existe um grupo coral de marinheiros mercantes, intitulado “Stortebekers”, fundado em 1962 juntamente com o “Clube de marinheiros da Suíça”. O coro dispõe de vinte membros, incluindo também dois acordeonistas. A grande parte desses marinheiros embarcou durante muitos anos em frotas oceânicas e de navegação do rio Reno. Quem diria!
Existem países distantes do mar, que também têm navegação oceânica, dentre os quais a Republica do Paraguai, que também possui marinha de guerra, motivado pela enorme quantidade de rios navegáveis que possuem. Eu próprio já atendi no porto de Leixões alguns navios da sua marinha mercante, que eram tripulados por oficiais, sargentos, cadetes e praças da armada e ainda o NE GUARANI, um antigo navio costeiro holandês, armado em navio escola militar, contudo afecto ao serviço comercial Paraguai/Europa ou EUA via Rio da Prata e Rio de Janeiro.


O navio-motor GRANDSON (2) demandando o porto de Leixões, década de 60, /(c) Foto.Mar, Leixões/

O navio-motor RHONE, ostentando as cores da companhia Francesa SEAS, /(C) imagem da Suisse-OutreMer/

O navio-motor LAUPEN no porto de Leixôes, 22/06/1968, /(c) Foto de Rui Amaro/

Navio de pás do lago Lucerna / Brochura do Tirismo Suiço /.

Referencias:

Rui Amaro

domingo, 22 de fevereiro de 2009

O NAVIO-MOTOR NORUEGUÊS “BRAVO” PERDEU O LEME DURANTE UMA TEMPESTADE MAS SEM QUALQUER AUXILIO CONSEGUE CHEGAR A BOM PORTO, GRAÇAS Á DECISÃO DO CAPITÃO

O BRAVO em manobras de acostagem no porto de Leixões, 1953 (Foto de F. Cabral).

O BRAVO (2), que escalara o porto de Londres vindo do Mediterrâneo, portos Italianos, Franceses, Espanhóis e também de Portugal, Lisboa e Leixões e rumava ao porto Norueguês de Aalesund, a fim de ali descarregar uma importante partida de sal destinado à cura do bacalhau, quando em 22/02/1954 no Mar do Norte ficou envolvido numa violenta tempestade, que lhe arrebatou o leme, ficando o navio sem governo, à deriva e à mercê do mau tempo. O seu capitão tratou de avaliar a delicada situação, contudo não pediu assistência de rebocador.
Como o navio tem só um hélice, não pode socorrer-se do sistema, pouco tempo antes utilizado por outro navio Norueguês, o paquete STAVANGERFJORD, da Norske Amerika Linje, que, tendo também perdido o leme, em pleno Atlântico, conseguiu por meio de sucessivas manobras alternadas de inversão do movimento dos dois hélices trazer o navio ao porto de Oslo, a onde se destinava.
Quando uma alterosa volta de mar quebrou o leme do BRAVO, o capitão, valorosamente secundado pela sua tripulação, mandou imediatamente preparar um longo cabo, que foi fixado na popa do navio e lançado ao mar, à guisa de longa cauda. Em seguida foram descidos os dois paus de carga da ré, um para fora de cada borda, com espias de aço que das pontas iam fixar-se no longo cabo à popa. Manobrando então os paus de carga puxava-se o cabo quer para um lado, quer para o outro, conseguindo-se assim orientar o navio até perto da costa Norueguesa. Então, com outro pau de carga e com pranchas retiradas das escotilhas, construi-se um leme de recurso que, suspenso à popa, permitiu governar o navio até ao ancoradouro no porto de Stavanger, onde arribou.


Capitão Erik Lindstol


O capitão, Erik Lindstol, é natural de Risor, tradicional terra de marinheiros, no Sul da Noruega, e, abordado pelos jornalistas à chegada a Stavanger, esquivou-se, modestamente a fazer declarações, dizendo que apenas tinha cumprido o seu dever, utilizando todas as possibilidades disponíveis para trazer o navio a bom porto. Procurando dissimular o cansaço, causado por uma permanência de 36 horas na ponte de comando, afirmou, que apenas atribuía o seu êxito a muitíssima sorte
Após as necessárias reparações o BRAVO voltou ao mar e escalou o Tejo, como antes comandado pelo capitão Erik Lindstol, que pelo seu feito foi condecorado com a Ordem do Santo Olavo, pelo Rei da Noruega, e aquele oficial da Marinha Mercante Norueguesa mereceu a admiração geral, que teve repercussão em todo o mundo – e valeu-lhe como acima se disse ser condecorado pelo próprio Rei dos Noruegueses.


O BRAVO no porto de Lisboa, vendo-se dois dos paus de carga, que foram lançados à água para ajudar o navio a governar. (Gravura de noticia da Imprensa diária nacional).


O navio italiano GIUSEPPEEMME, ex BRAVO, largando do porto de Leixões em 15/07/1967 (foto de Rui Amaro).

O BRAVO que era muito conhecido em Lisboa e Leixões, onde costumava vir com regularidade descarregar bacalhau, papel e outros produtos Noruegueses, e carregar mercadoria Portuguesa, como cortiça, resinas, vinhos, etc. Dessa vez veio ao Tejo, em rota para o Mediterrâneo, descarregar papel para a imprensa e a sua entrada no porto de Lisboa suscitou viva curiosidade.
O BRAVO, m/1.864tb; 1171943, as ATLAS, retido pelos Alemães enquanto n carreira do estaleiro Holandês Pot Gebroeders NV. Bolnes, para entrega à KNSM, Amesterdão, tendo sido denominado pela “Kriegsmarine” SPERRBRECHER 181; 1944 seriamente danificado por ataque da RAF e varado em praia; 1946 posto a flutuar e baptizado como AKSLSUND pelos salvadores Ludv. Fladmarks Salvage, Sonner, Alesund; 1952 BRAVO (2), Den Norske Middelhavslinje, Fred Olsen A/S, Oslo; 1967 GIUSEPPEEMME, Ignazio Messina S.p.a., Genoa; 1974 Managro, F.S.Panachrantos, Piraeus; 19/03/1979 chegou a Brindisi para demolição.
Fontes: Imprensa Diária, Miramar Ship Index e Kroonvaarders (KNSM).
Rui Amaro