BENCRUACHAN / autor desconhecido - Photoship Co., UK /.
Finais
de 1974, escalava o porto de Leixões, em rota do Extremo Oriente para
Inglaterra, como tantas vezes o fazia, o belíssimo e excelente navio-motor Inglês
BENCRUACHAN, imo 6814829/ 170,2m/ 12.092tb/ 21,5 nós, lançado à água a
16/04/1968 pelos estaleiros Charles Connel & Co., Ltd., de Scotstoun,
Glasgow, e pertencente à importante e vetusta casa de navegação Ben Line
Steamers Ltd., Leith, ao serviço do grupo BenOcean, Liverpool, onde descarregou
entre uma grande variedade de mercadoria, CKD (caixas c/ elementos para
montagem de automóveis), borracha para artefactos e pneumáticos, etc. Nada de
interesse haveria a relatar, salvo um grave e invulgar acidente ocorrido, numa
das suas rotas “homeward".
Ás
primeiras horas de 02/05/1973, durante a viagem do porto de Djakarta para o de
Londres, pela rota do Cabo, devido ao bloqueio do Canal de Suez, o BENCRUACHAN,
um navio de sólida construção, esteve na iminência de sofrer um golpe fatal, quando
navegava com a máquina à velocidade de 19,5 nós, a cerca de 80 milhas a sudoeste do
porto de Durban, foi imprevisivelmente batido por uma volta de mar descomunal,
sem que ninguém contasse com uma onda de tal magnitude, que subiu ao nível da
ponte de comando.
O
navio meteu-se de proa na referida volta de mar, a qual quebrou dentro do navio
e levou borda fora três contentores, um dos querenos e outros materiais, que se
encontravam estivados no convés, capazmente peados, e quase destruiu ou
arrancou, completamente a sua proa, a qual ficou alquebrada por detrás do porão
nº 1. Note-se que o castelo de proa era bastante alongado. Foi um grande
milagre ter resistido, caso contrário teria perdido a sua proa e muito
possivelmente ter-se-ia afundado com perda de 52 vidas.
O
petroleiro Inglês FLOWERGATE, navegando nas proximidades, e aos primeiros
pedidos de socorro acorreu ao local, e preparava-se para lançar as baleeiras ao
mar, o que foi desnecessário, visto a situação no navio acidentado se ter
estabilizado, todavia um helicóptero recolheu um casal de passageiros,
levando-os para terra, além disso um rebocador e um salva-vidas zarparam de
imediato um porto algures na costa Sul Africana. O FLOWERGATE ficou a pairar
junto do navio sinistrado até à chegada de rebocadores, os quais tentaram
conduzi-lo de regresso ao porto de Durban, contudo a autoridade marítima
impediu a sua entrada, como é óbvio, devido ao navio estar muito metido de proa
e como tal não haver água suficiente mas também por o porto se encontrar muito
congestionado, que foi uma das razões, porque o BENCRUACHAN, que vinha de rumo àquele
porto para bancas, e impedido de entrar, prosseguiu a sua rota para sul, a fim
de demandar o porto da Cidade do Cabo e acabou por encontrar aquele imprevisto
vagalhão de cerca de 14
metros.
O BENCRUACHAN
ficou ancorado ao largo de Durban, onde baldeou a sua carga para outras
embarcações, conquanto, apesar de estar localizado em águas calmas, continuava sujeito
a submergir. Passados dez dias foi levado para o porto, tendo recebido
reparações provisórias e colocadas placas metálicas de protecção em toda a zona
afectada e então iniciou a viagem para a Europa em lastro, pelos seus próprios
meios, tendo recebido as reparações finais pelo estaleiro Rotterdamsche
Droogdock Mij., Roterdão, continuando a fazer a rota do Extremo Oriente,
escalando também o porto de Leixões na sua rota “homeward”, até à sua venda em
08/1980 a sucateiros de Kaohsiung, Taiwan, onde acabou os seus dias, após 12
anos do lançamento à água no Clyde.
Felizmente
nessa viagem acidentada, contra o usual, não escalava Leixões, o que a
efectivar-se teria sido uma grande trabalheira com a obrigatoriedade dos
recebedores e seguradoras das mercadorias terem de apresentar os usuais
"average bonds" e os respectivos depósitos das verbas "ad
valorem" estipuladas pelos P & I, aos agentes consignatários da
BenOcean, a firma Soc. Com. Garland, Laidley, do Porto.
O BENCRUACHAN
tornou-se também, um de uma longa lista de acidentes, que incluíram, nos últimos
anos, o transatlântico Inglês EDINBURGH CASTLE (avarias bastante graves), o
petroleiro Liberiano WORLD GLORY e muito provavelmente o desaparecimento do paquete
Inglês WARATAH há cerca de cem anos. A Union Castle Line, armadora do EDINBURGH
CASTLE passou a instruir os seus capitães para navegarem mais ao largo, nas 200
braças, onde a agitação marítima não é tão perigosa.
Consta
que alguns meses depois, um moderno navio da Neptune Orient Line, Singapura,
julga-se que fosse o NEPTUNE PEARL, 222m/
31.077tb, também foi notícia de ter sido atingido por uma dantesca volta de mar
que lhe causou danos graves, na mesma área onde se deu o acidente do BENCRUACHAN,
se bem que em ambos os casos não houvesse vitimas.
O BENCRUACHAN ao largo do porto de Durban, vendo-se a
sua proa alquebrada por detrás do porão nº1 / Gravura de artigo do Fairplay International
Shipping Journal, 20/09/1973 (by Nicholas Dudley) /.
Também
o paquete Português VERA CRUZ, 186m/ 21,750tb, da CCN, Lisboa, não foi excepção
às chamadas ondas sísmicas gigantes da costa Sul Africana, corrente das
Agulhas, quando na madrugada de 26/05/1970, com cerca de 3.000 pessoas a bordo,
na sua maioria militares, que regressavam à metrópole, após a sua dura e longa
comissão de serviço em território de Moçambique, perto do Cabo das Tormentas,
nas 100 braças, foi apanhado por uma onda descomunal, que além de fazer avarias
graves nas estruturas daquele enorme navio, fez quebrar os vidros temperados de
todas as janelas da ponte de comando e ainda fez desaparecer mapas, cartas de
marear, réguas, esquadros, compassos, etc. dos armários da casa de navegação e
por aí além. Note-se que aquelas estruturas estavam a 20 metros acima do nível
do mar.
Apesar
do grande susto de todos a bordo e muito mais da tropa, praticamente não houve
sinistrados. O navio retrocedeu para o porto de Lourenço Marques, a fim de
receber as reparações provisórias. Segundo relato do imediato, ao semanário
Noticias Magazine, de 31/03/2002, que na ocasião do embate ia de quarto,
juntamente com um marinheiro, se vem uma segunda volta de mar de igual
magnitude, muito possivelmente o VERA CRUZ não resistiria.
No
inicio dos anos 50, o paquete Português SERPA PINTO, 137m/ 8.267tb, da CCN,
Lisboa, transportando passageiros e carga para o Brasil, já por fora do farol
do Esporão de Leixões, quando ia de saída, também sofreu o embate de uma volta
de mar descomunal, se bem que própria de tempestade, que lhe causou danos nas
estruturas da proa e ferimentos em alguns tripulantes. Em face desse incidente
esteve a pairar ao largo até a situação acalmar, prosseguindo a viagem para o
porto de Lisboa sem mais percalços.
Agora
recue-se alguns séculos e veja-se as naus, caravelas ou galeões da carreira da
Índia, verdadeiras cascas de nóz, os sacrifícios, que aquelas gentes devem ter
passado e aqueles que por ali ficaram, como o Bartolomeu Dias, quando tentavam
fazer aguada nas costas da hoje África do Sul, Madagáscar ou de Moçambique,
etc.
Fontes: Freak Waves; Fairplay
International.
Rui
Amaro
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